A prática da economia
solidária é um exercício libertador, é uma forma organizada de distribuição de
riquezas que valoriza a humanização do trabalho com base na autogestão, ou
seja, na auto-organização de todos os envolvidos no processo de produção,
colocando na prática a real democratização nas decisões, na organização do
trabalho e na distribuição dos seus resultados. É também uma busca pela
construção de uma sociedade mais justa, livre das desigualdades econômicas, sem
exploração de uma classe social sobre outra, numa perspectiva de um meio
sustentável em equilíbrio com a natureza.
Em Salvador, redes de economia
solidária implementam atividades contínuas de produção e de sustentabilidade com
base no cooperativismo, experimentando possibilidades de atuação conjunta em oportunidades especiais. Um desses
momentos é o Projeto Ecofolia Solidária
- O Trabalho Decente Preserva o Meio Ambiente, que envolve o Complexo
Cooperativo de Reciclagem da Bahia, a Rede de Alimentação Solidária e a Rede de
Costura da Bahia, totalizando mais de 25 empreendimentos econômicos solidários,
entre cooperativas e associações.
O projeto, financiado pelo
Estado com apoio da Prefeitura e de organizações não governamentais, é pioneiro
na capital baiana como forma de valorização e reconhecimento dos catadores de
material reciclável Com 10 anos de funcionamento, o Ecofolia Solidária oferece uniforme, material de proteção
individual (botas, luvas e protetores auriculares) e três refeições diárias para 2675 beneficiários que atuam no recolhimento de material reciclável
durante o carnaval da capital baiana.
O lançamento oficial do
projeto ocorreu na sexta-feira, dia 07/02/2013, em Ondina, em um dos cinco
postos de apoio aos catadores distribuídos em pontos estratégicos no circuito
do carnaval. Logo após o lançamento, uma fila de catadores foi formada para a
realização do cadastramento, que tem por finalidade o levantamento de dados
sobre os beneficiários do Projeto e um possível acompanhamento em alguns casos
específicos. Em seguida foram distribuídos os uniformes com o material de
proteção individual e iniciado o recolhimento do material reciclável Durante
todos os dias, o Complexo Cooperativo de Reciclagem recolhia material e pagava
à vista, eliminando os atravessadores e facilitando a vida dos trabalhadores.
Na fila para o
cadastramento, Antonio Francisco da Silva (48 anos), que atua como catador,
afirmou que “o projeto é importante porque além de contribuir com a limpeza da
cidade ajuda pessoas que não têm outras oportunidades de trabalho, garantindo a
alimentação e proteção pra quem faz o trabalho cansativo da catação”.
Para Joilson Santana, um
dos coordenadores do Complexo Cooperativo, “é preciso que o projeto se estenda
por todo o ano, como política pública, para que possa garantir um
acompanhamento efetivo dos beneficiários, até porque, para que o projeto
adquira plenitude nos objetivos, é necessário que haja uma educação ambiental
envolvendo toda a população”.
Próximo ao Campo Grande, no
Colégio Estadual Manoel Novaes, integrantes da Rede de Alimentação Solidária, mobilizavam
um grande aparato de pessoas e equipamentos para garantir as refeições no dia
seguinte, cerca de 2700 por turno. As cooperativadas, em sua maioria mulheres
negras, organizavam as atividades de produção em um clima que envolvia
ansiedade e concentração, com espaços pra sorrisos, abraços, confraternização e
alegria pela realização de mais uma atividade em conjunto. Além das outras
edições do projeto Ecofolia Solidária,
a rede já deu conta de diversas atividades de grande porte, como o fornecimento
de alimentação para os participantes da Cúpula Mundial dos Povos, realizada no
Rio de Janeiro em junho de 2012. Nessa ocasião, mais de 200 cooperadas e
cooperados baianos viajaram para o Rio, chegando a produzir mais de 18.000
refeições por dia.
Janice Vieira, integrante
da COOFE (Cooperativa Múltipla Fontes da Engomadeira), há seis anos no projeto,
considera que a integração das redes de reciclagem, costura e alimentação é um
dos fatores mais importantes do projeto. “Além do fortalecimento das redes, o
projeto possibilita o envolvimento de outras redes como a da agricultura
familiar, por exemplo, além de consolidar o amadurecimento da autogestão
enquanto política interna e da gestão das políticas administrativas operacionais
do trabalho. Isso facilita inclusive a intervenção das redes nas comunidades de
onde as cooperativas são originárias, como os cursos de cooperativismo e a
Feira de Saúde, Cultura e Economia Solidária realizada pela COOFE no bairro da
Engomadeira. Muito importante para esse fortalecimento tem sido o apoio da
Organização Vida Brasil, assessorando e ajudando estruturalmente”.
Com 12 anos de
participação em atividades da economia solidária, Ligia Andrade, da ADOCCI (Associação
das Doceiras, Cozinheiras e Confeiteiras de Itapagipe) considera que a rede
está em um nível bem avançado, capaz de cumprir grandes demandas, e que depois
da participação na Cúpula dos Povos durante a Rio + 20 muitas pessoas se
interessaram pelas propostas da economia solidária, procurando entender mais e
participar das redes. Afirma ainda que “a economia solidária precisa ter mais visibilidade e reconhecimento porque ainda é desconhecida pela grande maioria da população e sofre muita desconfiança por parte do Estado, que precisa ser um parceiro mais efetivo”.
A satisfação pela
realização do trabalho era latente e visível nos corredores do Colégio Manoel
Novaes. A atenção e o empenho coletivo impressionavam a quem pôde testemunhar
os trabalhos de produção das refeições durante os dias de carnaval. A
solidariedade, o companheirismo e satisfação fazem da economia
solidária, além de uma proposta de transformação social, uma prática de
realização coletiva altamente prazerosa que se percebe entre sorrisos e aplausos
para cada entrega de refeições realizada.
Texto: Marcos Grito
Fotos: Paulo Magalhães
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